COBRANÇA INDEVIDA X DANOS MORAIS

Com a terceirização dos serviços nas grandes empresas, tem sido cada vez mais comum o consumidor se deparar com o recebimento de cobranças indevidas, seja por produto não adquirido ou serviços não contratados.

Essas cobranças são efetuadas através do envio de correspondências, e-mail e até mesmo por mensagem de texto via celular.

A maioria dos consumidores não se importam com o envio dessas cobranças uma vez que indevidas. Assim que recebidas, as cobranças são descartadas, apagadas e encaminhadas à lixeira.  

Fiquem atentos porque a cobrança indevida gera dano moral e o consumidor submetido a esse dissabor deve ser, financeiramente, recompensado pela empresa causadora desse infortúnio.

Encontramos recorrentes casos de cobrança indevida dentro de uma fatura de serviço contratado pelo consumidor. Geralmente as empresas de telefonia atuam dessa forma. As operadoras “embutem” na fatura do consumidor uma série de serviços não contratados e o consumidor acaba pagando sua fatura sem notar a cobrança desses serviços não contratados.

Nestes casos, caberá a empresa demonstrar que o consumidor solicitou a ativação dos serviços, em especial, porque o consumidor é vulnerável não podendo comprovar documentalmente que não solicitou a ativação daquele serviço. Se a empresa não comprovar que o consumidor contratou o serviço, será obrigada a devolver ao consumidor tudo aquilo que ele pagou, indevidamente, em dobro.

Em princípio a mera cobrança de produto não solicitado não enseja condenação por danos morais. Agora se essa cobrança for reiterada e realizada de maneira insistente pela empresa o consumidor fará jus a indenização por danos morais que nossos Tribunais vem arbitrando entre R$ 3.000,00 à R$ 8.000,00.

Já nos casos de cobranças indevidas referentes à produtos não adquiridos ou serviços não contratados outros pontos devem ser observados para que o consumidor seja indenizado. A cobrança indevida deve ser realizada insistentemente pela empresa ou seja, de forma reiterada. A periodicidade (dias, meses, anos) da cobrança será um dos fatores considerados para avaliação do dano. O consumidor terá pontos à seu favor se demonstrar que tentou resolver a questão junto à empresa através de notificação, e-mail ou ligação, sem sucesso. A forma como a cobrança é realizada também será analisada, pois, muitas vezes expõem o consumidor à situações vexatórias. A idoneidade do consumidor também será levada em conta, além de todo e qualquer transtorno que aquela cobrança tenha causado na vida do consumidor. Assim, a análise da cobrança indevida ser ou não indenizável dependerá de um olhar em conjunto de todos esses fatores, sendo que a indenização quando arbitrada tem sido em torno de R$ 5.000,00 dependendo como já dito, das circunstâncias de cada caso concreto.

Por fim temos os caso de negativações indevidas sejam elas decorrentes de débito inexistente ou débitos já quitados. Muitas vezes as empresas inserem, indevidamente, o nome dos consumidores no rol dos maus pagadores (SERASA – SPC), sendo que nesses casos temos a configuração do dano moral “in re ipsa” ou seja independe de comprovação do abalo psicológico sofrido pela vítima. Para esse consumidor, basta comprovar que aquele débito é indevido e que seu nome foi negativado indevidamente para ser indenizado, sem a necessidade de qualquer outra prova. Nestes casos, as indenizações variam de R$ 10.000,00 à 20.000,00, dependendo da peculiaridade de cada caso concreto.

Assim, toda e qualquer cobrança que chegue ao conhecimento do consumidor deve ter a devida atenção, pois, muitas vezes quando descartamos esses documentos ficamos sem provas das ilicitudes praticadas pelas empresas.

Ana Cecília de Mattos – Advogada – OAB.SP n.º 205.245

DIVÓRCIO COM FILHOS: “O filho como moeda de troca”

Vivemos numa geração com mais filhos de pais separados. Segundo dados do IBGE , em um balanço feito nos últimos 40 anos, 1 em cada 3 casamentos terminam em divórcio. O número e a frequência de casais divorciados é uma realidade considerável sendo possível notar os mais diferentes tipos de relações estabelecidas após o divórcio.

Existem casais que encerram a relação, colocando os filhos em posição de supremacia. Conseguem administrar os sentimentos, preservam a imagem do outro genitor e muitas vezes a criança inserida nesse contexto, aparentemente estável, sente-se no lucro. Duas casas, duas famílias e dois genitores que fazem de tudo para vê-la feliz. Os pais com esse perfil abdicam do EU para ver o que se ajusta melhor ao filho e assim os interesses acabam se colidindo. Nestes casos, o divórcio é feito de maneira amigável, através de reuniões com os advogados e quando se ajustam em todos os pontos: guarda do filho, visitas, pensão alimentícia, divisão de bens e etc, os advogados redigem um acordo, o casal assina e sem maiores traumas o divórcio é homologado pelo Juiz e a vida segue moldada pelos parâmetros estabelecidos no acordo e na maioria dos casos até fora do acordo, uma vez que o consenso impera. 

Outro tipo comum de cenário, são os casais que no curso do divórcio vestem armaduras, dispostos a guerrear e lançar o armamento que for preciso para ferir o ex-cônjuge. Nestes casos, nós advogados, temos a função de desarmar as partes, orientando-as sobre os benefícios da construção de uma solução pacífica. Muitas vezes conseguimos resultados positivos em alguns pontos do divórcio e discordância em outros pontos. Quando isso ocorre, nossa sugestão é que o divórcio seja realizado parcialmente, homologando os pontos onde existe consenso e deixando as questões controvertidas para serem objetos de ação posterior. A criança inserida neste contexto sofre sérias transformações ao longo do processo do divórcio, pois, muitas vezes sentem a amargura do genitor com quem convive, além da ausência do outro genitor que antes tinha a convivência diária. A criança tem pouco discernimento e compreensão para administrar toda essa mudança sendo indiretamente afetada pelo litígio dos pais, ainda que parcial.

Dentre todos os tipos possíveis e imaginários de casais que estão na iminência do divórcio e muitas vezes o mais comum, é aquele tipo de casal que encerra a relação em decorrência de traições, mentiras ou qualquer outro motivo que impeça o perdão imediato e o restabelecimento da paz. Para esses casais o litígio é certo e não parece existir acordo em nenhum dos quesitos do divórcio. Discordam sobre a guarda dos filhos, pensão e bens. Os filhos são inseridos desde o início no conflito do casal em ações altamente destrutivas. Esses casais, raramente, conseguem visualizar os malefícios que causam diante desse contexto de guerra declarada, deixando marcas profundas e dolorosas em seus pequenos. 

O Divórcio Litigioso é um processo extenso, demorado e altamente desgastante para todos envolvidos. Nesse contexto, os filhos deixam de ter a atenção dos pais, que em vez que perseguirem o melhor interesse das crianças buscam no divórcio uma forma de revidar todas as mágoas do passado. Neste cenário as partes e as crianças passam por entrevistas no Setor Psicossocial do Judiciário, que através de Laudos buscam orientar o Juiz nesta difícil decisão. Todo o processo que envolve o litígio é desgastante e demorado.

Por tais razões, quando nos deparamos com esse cenário, nós advogados, temos a função social de conscientizar e orientar as partes sobre os prejuízos do Litígio e da importância de priorizar os interesses dos menores. Demonstrar que no divórcio não existe ganhar ou perder quando se constrói uma solução em conjunto através do consenso. Nem sempre a construção de soluções amistosas é possível sendo que na maioria das vezes, o insucesso se deve à falta de orientação e estímulo do consenso pela outra parte. Por isso, muitas vezes somos obrigados a enfrentar litígios altamente destrutivos, provocando a ausência total de diálogo entre as partes, que necessitam da intervenção constante de interlocutores para se comunicarem, sendo que, indiretamente, todas as mágoas e ressentimentos do passado recaem sobre os filhos, que no futuro terão grandes chances de reproduzir essa vivência quando da construção da sua família ou ficarão perdidos e sem referência do conceito de família, além de todos os problemas desencadeados na infância em decorrência da inserção prematura no litígio dos pais.

Por isso, além de advogar, os profissionais que aceitam o desafio de atuar na área da Família, necessitam cada vez mais deixar transparecer e prevalecer a sensibilidade que deve ser materializada na orientação das partes sobre os benefícios da construção conjunta de uma solução quando o casamento chega ao fim. A importância de adequar e construir um novo modelo familiar pós-divórcio, esquecendo-se as mágoas do passado em um ato extremo de amor aos filhos. Muitas vezes, esse passado precisa ser colocado à mesa, esclarecido, falado, diagnosticado para que as partes possam superar e construir o futuro.  Nestes casos, recorremos ao auxílio de profissionais como terapeutas e psicólogos que através de sessões de terapias e outras técnicas conseguem ajudar as partes a pormenorizar o passado, superando as mágoas e abrindo espaço para a construção de um futuro. Sem dúvida, nós advogados, temos a grande responsabilidade em demonstrar que o consenso é a melhor forma de encerrar um casamento, uma vez que possibilita que os filhos sejam poupados, permitindo e preservando a convivência pacífica com as duas referências mais importantes na vida deles, o Pai e a Mãe. 

Ana Cecília de Mattos Caritá

OAB.SP n.º 205.245